Na semana passada, a 100fronteiras entrevistou o Deputado Vermelho, onde ele pôde falar sobre o seu polêmico projeto da Estrada do Colono

Após a matéria, Raby entrou em contato pedindo para contar um outro lado. Raby Khalil é ambientalista ativista e presidente do Conselho Municipal do Meio Ambiente de Foz do Iguaçu. Confira a entrevista abaixo.

Ambientalista Raby Khalil fala sobre a Estrada do Colono
Raby Khalil. Foto: 100fronteiras.

100f: Você pode falar sobre a Estrada do Colono? 

Raby Khalil: Quando o deputado fala sobre a Estrada Parque e que no Brasil existem inúmeras Estradas Parques, não é verdade, e não é um julgamento, é uma afirmação. A BR 469 por exemplo, que liga a entrada do Parque Nacional ao atrativo turístico ela não é uma estrada de conexão entre cidades, ela é uma estrada fim, ela tem uma rotina específica e está na borda do Parque e não no centro, já o antigo leito da Estrada do Colono, o fechamento dela foi uma correção histórica em relação a área do Parque Nacional porque o Estado do Paraná é o Estado que mais devastou cobertura de área vegetal proporcionalmente em relação aos outros Estados brasileiros, isso significa que somos o Estado que mais cortamos floresta no Brasil, o estado que tem maior área proporcionalmente. Isso se deu pela agricultura extensiva, criação de gados e etc. 

100f: Isso significa que o Paraná é o Estado que mais desmata? 

Raby Khalil: É o Estado que mais desmatou proporcionalmente a sua área em relação a todos os estados do Brasil. Além disso quando falamos sobre uma estrada e há argumentações por exemplo “ah não é uma estrada rasga parque” obviamente que é uma estrada rasga parque porque é só pegar o mapa, entender a conjuntura do Parque Nacional do bioma e a reserva. E quando você faz isso, vê que ela ligaria dois municípios, o de Capanema que está no leste e o município de Serranópolis do Iguaçu que está na faixa oeste, e ela liga através de qual ponto? Ela liga o Parque pelo menor ponto, então pegando o Parque em sua extensão latitudinal ela vai encontrar eles no menor ponto, e é ali que abrem os 17 km e o que acontece com a face norte do Parque? Ela é isolada. E qual o histórico do Paraná em relação a cobertura vegetal? É um histórico de devastação, porque historicamente é o Estado que mais derrubou área vegetal. Então quando falamos de uma Estrada com esse objetivo de ligar Serranópolis a Capanema, com todo respeito a esses municípios, onde tenho amigos e também já fiz turismo lá, e não precisei passar por dentro do parque para chegar nessas cidades. Aqui o único objetivo é ligar dois pontos.

100f: E qual seria esses dois pontos?  

Raby Khalil: Esses dois pontos seria Serranópolis do Iguaçu a Capanema. Foz do Iguaçu fica nesse meio por causa do Parque Nacional a nossa defesa é do Parque Nacional e obviamente que também em defesa não só de Foz do Iguaçu mas também de todos os municípios entorno do Parque. Porque se essa estrada sair nós perderemos o título de patrimônio natural da humanidade concedida pela UNESCO. O Deputado coloca como argumento a Estrada Parque do lado argentino, com respeito a opinião dele, mas é uma opinião equivocada porque essa estrada que ele se refere na Argentina, nem de bicicleta as pessoas conseguem andar nela. Ela é uma estrada com a finalidade de servir os guardas parques do lado argentino, não é uma estrada de rota, conexão e nem uma estrada turística. E diferente do que acontece com a estrada do Parque Nacional a pseudo Estrada do Colono que não existe mais que eles querem abrir, a estrada da Argentina não corta o Parque Nacional argentino ao meio, é uma estrada que está na borda do Parque. 

100f: Seria como a Avenida das Cataratas? 

Raby Khalil: Como a Avenida das Cataratas, ou como por exemplo, um pedaço da BR 469 que liga o portal do Parque às Cataratas do Iguaçu, ela é uma estrada fim, com um objetivo, ela não é uma estrada que liga a outra cidade e nem com trânsito pesado, na Argentina a estrada também é uma estrada de borda, não é uma estrada que coloca em risco o Parque Nacional argentino, a nossa opinião como ambientalista se possível fosse é que também fosse fechada porque não é uma estrada, ela é um carreirão de terra, e muitas vezes nem de bicicleta você passa por ela, então é uma finalidade da passagem dos guardas parques argentinos, ela não tem a finalidade de uma Estrada Parque ecológica, que é o que o Deputado justifica, trazendo modelo dos Estados Unidos, as Estradas Parques dos Estados Unidos não tem esse conceito de cortar Parques Nacionais ao meio, elas estão sempre nas bordas. O deputado diz que querem desfrutar da natureza, eu estou cortando a floresta, do lado direito tenho floresta e do lado esquerdo também, fiz 500m de floresta e vou continuar vendo floresta, é esse o objetivo? Ver floresta em uma estrada que vai estar toda cercada para ver mata? Então o argumento ecológico é infundado, não é baseado em quem entende de turismo. 

Estradas

Raby Khalil: Falando de estradas no Estado do Paraná, nós temos por exemplo a BR 469 que liga o centro de Foz até o portão do Parque e depois tem o trecho que liga às Cataratas. São quantos anos de reivindicação pela duplicação dessa BR ou pela melhoria das condições dela e até hoje isso não foi desenvolvido. Nós temos por exemplo, a PR 495 (estradas estaduais) que liga Serranópolis até o município de Marechal Candido Rondon atravessando a BR 277 nós temos Serranópolis, Medianeira, São Miguel do Iguaçu, Missal Itaipulândia, Santa Helena, Entre Rios do Oeste, Pato Bragado, Marechal Cândido Rondon, Mercedes e Guaíra, são 11 cidades, a maior cidade entre todas elas é Marechal com 55 mil habitantes um dos outros argumentos é que essas cidades vão se desenvolver, porque estão isoladas, mas isso não se justifica, nós temos o município de São Miguel que passa uma BR extremamente importante que é a BR 277 e o município tem 26 mil habitantes, se pegar o histórico de 10 anos atrás não mudou quase nada, o jovem de Serranópolis, Capanema e de Lindoeste fazem parte da cultura das pessoas saírem das cidades pequenas, dos pais se desenvolverem ali e mandarem seus filhos para as cidades polos. Então por exemplo, você pega a PR 495 que vai de Serranópolis, Medianeira atravessa a BR 277 é uma rodovia que corta ao meio todas as cidades, e são cidades pequenas, na média elas tem 15 mil habitantes ou menos e já são 30 anos que é a mesma coisa, elas não se desenvolveram porque tem uma estrada. Mas vamos ao um outro ponto econômico, elas não se desenvolveram porque tem uma estrada ali, e quando eu falo dessa PR eu falo da zona de influência da Itaipu, são cidades que recebem Royalties e nem por isso se desenvolveram ao ponto de se tornarem núcleos populacionais ou cidades regionais, elas continuaram sendo cidades pequenas, Itaipulândia não vai conseguir ocupar por exemplo a posição de Santa Helena e Santa Helena não vai conseguir ocupar a posição de Marechal, porque elas são cidades polos que atraem todas essas outras cidades, elas podem ter uma movimentação populacional entre elas mas elas não crescem mais do que isso, porque tem Foz do Iguaçu, Cascavel, Medianeira, Toledo tem cidades polos maiores que já se desenvolveram. O plano de Concessão do Parque Nacional não é perfeito, mas resolve um problema histórico de isolamento desses municípios entorno do Parque, ele da oportunidade de conectar e criar regiões turísticas, não precisamos de uma estrada asfaltada para criar regiões turísticas. E existe também a Rota Beira Parque que margeia o Parque Nacional, se quisermos falar de desenvolvimento econômico, nós temos uma Beira Parque, e inclusive está sinalizada, e é isso que precisamos fazer. Ela é uma estrada de chão, de terra que margeia o Parque Nacional saindo de Foz até Céu Azul, Capitão Leônidas Marques, ele faz o contorno no Parque e é isso que precisa ser desenvolvido.

A Estrada do Colono não é simples de fazer, a geologia dela é extremamente difícil, tem transposição de rios, então economicamente é uma estrada muito cara de se fazer pelas condições do Parque Nacional, sem contar os impactos ambientais, hoje vivemos uma crise hídrica no Estado do Paraná e rasgar o Parque em dois e colocar a face norte em risco é acentuar a piora do problema da crise, nós também temos as condições climáticas que é um assunto complexo “mas isso é a nível de mundo” mas se eu tenho o maior  remanescente de Mata Atlântica no interior do Brasil que é o Parque Nacional, e quando falamos em maior parece que estamos falando de algo muito grande, e não é verdade, é algo pequeno. Rasgar o Parque é colocar toda a biodiversidade em risco porque o Estado do Paraná é o Estado que mais devastou cobertura vegetal proporcionalmente do tamanho de sua área no Brasil. Então porque vou acreditar que isso não vai continuar acontecendo? Os últimos 40 anos foram os piores e não foi algo que aconteceu no século 18 e 19 apenas e estabilizou, não, foram os últimos 40 anos, de 1980 para cá. Então é muito grave, esse projeto é um risco econômico para o município.

100f: Então não é uma estrada que vai fazer com que as cidades se desenvolvam? 

Raby Khalil: Exatamente, mas vamos para a questão econômica em relação às estradas, por exemplo, tem a BR 277 que liga Foz do Iguaçu a Paranaguá, são muitos anos, décadas que a sociedade paranaense luta pelo desenvolvimento dessa BR pela duplicação dela pela importância que ela tem para o Estado do Paraná é a BR federal mais importante para o Estado do Paraná, e nós não temos nem 300km duplicados até hoje depois de 30 anos de pedágio. Porque que irei acreditar que alguém vai fazer uma estrada com fim ecológico, sendo que nossas estradas estão sucateadas, se pegar a PR 495 ela vive em reforma, nunca alguém falou em desenvolver ela a nível de suportar definitivamente a carga de transporte agrícola que ela demanda, nós estamos numa zona turística mas a finalidade das estradas do interior do Paraná é escoar safra, elas não tem finalidade turística, obviamente que nós desenvolvemos polos turísticos mas o foco delas em sua ampla maioria é transporte de carga. Essa PR 495 se passar por ela, é o tempo todo caminhões das cooperativas e a população que é desse entorno que usam ela. 

Turismo

E falando de turismo, pegamos a Adetur, hoje os principais projetos que eles estão trabalhando no turismo para essa região são trilhas de longo curso, que por exemplo nos Estados Unidos são mais de 500 mil km de trilhas de longo curso, e hoje no Brasil nós temos um sistema nacional de trilhas de longo curso, então esto mostrando que não foram as estradas que estão levando as pessoas para o turismo no entono de Itaipu, é a Rota da Fé, a Rota dos Pioneiros que são trilhas de longo curso que envolvem tanto terra quanto água, todo movimento de defesa do Parque Nacional solicitou ao Parque que começasse já lá atrás a pensar no desenvolvimento das trilhas de longo curso dentro do Parque Nacional ligando todos os municípios entorno dele e não só os municípios de Capanema a Serranópolis do Iguaçu por uma estrada asfaltada, enfim existem “n” modalidades de ecoturismo que eles não precisam de estradas e que são tão poderosos economicamente. Por exemplo se aqui na nossa região as trilhas forem implementadas a tendência no médio e longo prazo é que gerem recursos econômicos para a região muito maiores do que é registrado em termos de recursos que entra na visitação das Cataratas, as trilhas de longo curso no mundo geram grandes receitas comparável por exemplo aos esportes de massa, mas que no Brasil não é tão difundido. 

100f: E como funciona essas trilhas de longo curso? 

Raby Khalil: As trilhas de longo curso conectam regiões, Parques Nacionais através das trilhas, por exemplo, no interior do parque são trilhas de caminhada e bicicleta, sair na BR 277 criando as trilhas dentro do interior do Parque, que são denominadas caminho do Peabiru, saímos desse caminho e chega na trilha de longo curso da Rota da Fé da Rota se conectamos com a trilha dos Pioneiros. Na história recente antiga os polos originários americanos se conectavam pelas trilhas de longo curso, saiam de Machu Picchu e parava, em Florianópolis e é esse tipo de turismo que bomba ecologicamente falando nos Estados Unidos na Europa, Oceania e países mais desenvolvidos. É isso que deveríamos promover aqui, imagina todas as cidades entorno do Parque Nacional conectadas por dentro através das trilhas de longo curso assim como é o caminho inca de Machu Picchu onde você caminha quatro dias e chega no atrativo principal que são as ruinas e finaliza seu passeio ali. Isso é totalmente viável de acontecer aqui e nós já viemos pedindo isso e trabalhando nisso a muito tempo. 

100f: Você acha que as trilhas de longo curso seriam uma alternativa? 

Raby Khalil: É uma alternativa viável e que está sendo implementada. Desde o primeiro dia que o Deputado depois de eleito voltou com o projeto da Estrada do Colono eu venho contestando ele nas redes sociais. Esse projeto juridicamente é Natti-morto porque no STF ele tem jurisprudência contrária, ele já foi debatido e o STF determinou o fechamento da estrada que cortava o Parque Nacional. 

100f: Qual é a preocupação dos ambientalistas? 

Raby Khalil: Infelizmente o Brasil não vive um momento de tranquilidade, de normalidade, existe uma exacerbação politica muito grande, o que aconteceu na Amazônia e Pantanal recentemente é o que nos amedronta porque assim que esse projeto continuar caminhando na câmara, a probabilidade de começarem a derrubar esse leito novamente criar esse leito de estrada é gigantesca porque vimos o que aconteceu com o Brasil em relação com o que o governo permitiu que ocorresse na Amazônia e Pantanal, ao desmonte ambiental no brasil. Os apoiadores da Estrada do Colono dizem “ah mas a BR 469 que liga o portão do Parque às Cataratas” nossa opinião como ambientalistas é que ela também seja fechada, então isso não é argumento para nós, mas isso não quer dizer que somos contra o atrativo, nós somos a favor de modais ecológicos, por exemplo trilha suspensa, trem elétrico, outros modais, nós somos a favor que nem um carro entre mais no Parque Nacional do Iguaçu. Mas também compreendemos, não somos ignorantes ao ponto de dizer que é imprestável, ela está ali mas tem um objetivo específico que é levar o turista para visitar as quedas, ela não tem um fim de conectar duas cidades, é injusto com a população? Acho que não. Quando falamos que Paraná é que mais devastou cobertura vegetal não é injusto com a população, é injusto com o meio ambiente, é injusto com as onças pintadas, é injusto com o quati, com toda a cadeia de biodiversidade, é injusto com nossa ciência, pois quanta cura tem lá dentro em termos de riqueza natural, remédio natural que pode ser pesquisado cientificamente, quanto poderíamos ganhar se pesquisar o Parque Nacional cientificamente. 

100f: e sobre replantar o que foi desmatado em outro lugar?

Raby Khalil: A partir do momento de conecta duas cidades de dois extremos, pelo menor ponto do Parque, é rasgado o Parque Nacional no meio e isolado a face norte. Reforçando o histórico de ocupação de cobertura de área vegetal no Paraná. Então vamos preservar o que temos e não o contrário. O Parque é um remanescente extremamente rico em termos de riqueza natural, biologia, uma biodiversidade muito rica para suprimir 30 hectares de área. Isolar a face norte é condenar ela. 

100f: quais são os riscos para o Parque Nacional com a Estrada do Colono?

Raby Khalil: O risco é que a face norte que é 70% do Parque, no curto-médio-longo prazo ele deixará de existir e perderemos toda a riqueza natural que tem ali. Por exemplo o projeto Onças do Iguaçu, quando ele começou, existiam duas/três onças no Parque, e hoje são uma população de mais de 60 onças, isso representa que o ecossistema do Parque Nacional está vivo, que ele funciona, que mantém o Rio Iguaçu limpo porque se subir o Rio Iguaçu ele está morrendo o Paraná está sofrendo a maior crise hídrica de toda sua história, os riscos ambientais são desastrosos, é uma catástrofe ambiental rasgar o Parque Nacional em dois. Colocamos toda a cadeia de biodiversidade desse rico ecossistema que se preservou em risco, quando menciono as onças pintadas porque são o maior mamífero, é o predador que está no topo da cadeia, e se ele está se reproduzindo é porque todo o ecossistema também está. Isso transforma o Parque Nacional no principal remanescente de interior de Mata Atlântica no Brasil em termos ambientais.

Não estamos aqui para criar atrito com os políticos, só queremos responsabilidade deles.

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