Não consegui dar adeus. Quando cheguei à locadora, ela já não “estava” mais lá. Fico feliz pelas lembranças. Marcou vários momentos da minha vida. Como a vez em que meu pai me levou junto com meus irmãos para ver o imenso palhaço que tinha na frente. Foram encontros sem planejamento.

Fins de semana assistindo a filmes com amigos. Conversas culturais no local. Sem falar no ótimo atendimento para as dicas de filmes. E, claro, não poderia deixar de lembrar-me das minhas tentativas frustradas ao tentar ser a “cliente do mês” no mural que ficava atrás do caixa, mas a galera que frequentava era realmente mais cinéfila que eu.

Essas foram algumas das características que mais me marcaram da videolocadora que abriu em 1986 e fechou suas portas há alguns anos.

“Não sei por que você se foi

Quantas saudades eu senti

E de tristezas vou viver

E aquele adeus não pude dar.”

Edson Trindade
Um símbolo da Playhouse: o Quati

Para quem é iguaçuense de coração, é impossível não se lembrar daquele local, que tinha uma lixeira gigante em formato de palhaço e um monumento de quati na frente. Chegavam fins de semana e férias, os frequentadores assíduos corriam para pegar o filme de lançamento.

Aos sábados e domingos, se você demorasse muito para conferir as novidades, principalmente no período de fim de tarde e noite, era complicado escolher um filme “bom”, pois a maioria já tinha ido para a casa das pessoas.

“Começou pequena no meio entre as famosas: Brasil Movie, Clube Filme Brasil, Columbia”

Marcello Cataldi um dos proprietários da Playhouse

Para ser considerada a maior videolocadora da cidade não foi fácil. Marcello Cataldi, que estava à frente da “Play” desde 1990, assumiu o negócio devido à morte do pai. Só tinha um funcionário. Os VHSs Não enchiam a prateleira.

Até então era o menor estabelecimento de locação de filmes da cidade. Marcello arrumava os filmes de um jeito para tentar disfarçar a falta deles. Apesar do grande desafio, assumir o negócio foi uma felicidade, pois ele gostava muito de filmes.

Na época, as VHSs eram todas piratas. Cataldi resolveu inovar para as originais, pois tinham melhor qualidade. E deu certo. A locadora começou a “bombar”. Nos anos 90, chegou a ter 12 mil itens para locação.

No auge do aparelho discman, Marcello inovou outra vez: colocou CDs de música para locar. O valor de compra deles era muito caro, não era todo mundo que poderia ter. Mais uma vez, a Playhouse acertou. O auge do sucesso estava chegando.

Interior da videolocadora Playhouse

O auge

A procura pela locadora começou a aumentar. Todo mês, o movimento melhorava. O horário de funcionamento mudou – naquele tempo, bem diferenciado para uma cidade de interior, passando a funcionar das 9h às 23h. Houve uma época em que chegou a ir até meia-noite.

Alguns dos funcionários que passaram pela videolocadora

A Playhouse chegou a ter seis lojas em Foz do Iguaçu. Talvez você não saiba, como foi o caso de quando compraram a locadora Columbia, que funcionava onde hoje fica o restaurante Maki Sushi. O nome dos estabelecimentos não era mudado. Marcello, com sabedoria de empreendedor, fazia uma concorrência velada. Cada loja com um nome diferente. No auge, chegou a ter 34 funcionários contratados. Muitas pessoas inclusive tiveram o primeiro emprego na rede.

Fachada da Playhouse, ano desconhecido

Com mais dinheiro no caixa, novos produtos foram surgindo. Jogos de videogames, cartões telefônicos, doces, pipoca… Posteriormente até uma lan house passou a funcionar no local.

Paixão pelos filmes

A paixão de Marcello pelos filmes começou nos tempos de moleque. O pai gostava muito de cinema e música. Cinéfilo desde muito cedo, o então garoto morava em São Paulo. No prédio onde funcionava o colégio em que estudava havia três cinemas: a Gazeta, Gazetinha e Gazetão. Ele e os amigos gazeavam aula para assistir a filmes. “A gente via sempre; programa de paulista: pizza e cinema”, conta. E dura até hoje, pois sempre que ele vai para outra cidade, ou até outro país, costuma ir aos cinemas e assistir em outro idioma mesmo.

Fim

Como tudo na vida tem um fim, com a maior videolocadora da cidade não foi diferente. O começo do declínio ocorreu na transição do VHS para o DVD, por conta da pirataria forte. As portas do grupo da Playhouse foram fechando uma a uma, até que sobrou só a matriz na Rua Almirante Barroso.

Apesar do prejuízo, Marcello, resistiu por tempos. A paixão por filmes falava mais alto. Algumas vezes tirou dinheiro do bolso para manter o estabelecimento. Mas quem “assassinou” mesmo a Playhouse foi o Netflix, afinal as pessoas já não saíam de casa para locar filmes.

Um lugar de tantas histórias que agora só deixa saudades.

Uma das primeiras fachadas da videolocadora Playhouse

COMENTÁRIO DE QUEM ESTÁ CHEIO DE SAUDADES

Vagner Santos da Silva:

“Esse ano foi marcante para muitas pessoas dos seus 30, 40 anos de idade. Muitos jovens sequer conheceram o ponto de encontro mais democrático de Foz, Playhouse Video. Numa época onde não tinha internet, esse era o local em que boa parte das pessoas se encontravam e trocavam suas impressões sobre os filmes assistidos. Mantenho contato com pessoas que conheci na Play até hoje. Saudades de um tempo que devido à tecnologia e facilidade digital, onde encontramos tudo em um clique, não voltará mais.”

Analia Vieira

“A vida nos proporciona alegrias e tristezas, vitórias e derrotas, decepções e conquistas, frustrações e sucesso, emoções. Dentre elas está a saudade de momentos indeléveis. Neste contexto, não poderia deixar de mencionar as boas lembranças da Playhouse Video. Não apenas pelos serviços prestados, pelos tempos juninos festivos, pelas emoções vivenciadas a cada filme assistido, mas também por ter sido a sede do nascimento de uma nova amizade, um dos mais nobres e importantes sentimentos humanos, com uma pessoa muito especial: Karina.”

Fabiano Bellon

“Sabe aquela empresa que além do bom atendimento, atenção e qualidade também te proporcionava alegria? Seja no habitual bom humor de todos os colaboradores, que tenho como amigos até hoje, nas excelentes indicações de filme, em um ‘dedinho de prosa’ sem compromisso… Essa era a Playhouse. Como sinto saudade destes momentos, das pessoas… Lembro de todos com muito carinho. Fui cliente diário da locadora por muitos anos e testemunhei a competência da Karina e do Marcello em conduzir uma equipe sempre atenta e responsável. Infelizmente testemunhei também a chegada de um inimigo cruel e desonesto chamado pirataria! E mesmo em um cenário totalmente desfavorável, a postura da empresa sempre foi de lealdade com o cliente, e isto, amigos, não tem preço. Obrigado, Playhouse, por ter feito parte da minha história.”

Marco Freire

“Novidades, clássicos, variedade, é isto que sempre encontrei na Playhouse! Claro que o bom atendimento fez com que o Marcello e a Karina se tornassem mais que proprietários da minha videolocadora preferida; fez com que se tornassem meus amigos que tenho até hoje. E o mais importante, ali foi um agente propagador da cultura, era ali que a gente buscava as novidades, as tendências do mundo. A Playhouse cumpriu seu ciclo, mas o que ela nos trouxe neste período em que funcionou faz parte da nossa cultura e ficou dentro do coração.”

Fotos: David Antunes e arquivo Playhouse
*Matéria publicada originalmente em novembro de 2015. Editada no dia 16/04/2020.

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