Confira a entrevista com a diretora de sustentabilidade e comunicação estratégica do London Supply Group, empresa argentina operadora do Duty Free Shop Puerto Iguazú.
Revista 100fronteiras: Com mais de 80 anos de trajetória, o London Supply Group se tornou um ator-chave no desenvolvimento econômico da Argentina e, em particular, da região de Puerto Iguazú. Quando começa a sua história nessa companhia?
María Taratuty: Desde que nasci. O London Supply Group está entrelaçado com a minha vida desde que tenho memória. Foi fundado em 1942 pelo meu avô, José “Pepe” Taratuty, pioneiro no setor, que lançou as bases da nossa companhia fornecendo mercadorias livres de impostos a navios de ultramar. Ao longo das décadas, esse espírito empreendedor nos impulsionou a diversificar os negócios. Com meu pai, Teddy Taratuty, como presidente do Grupo, nos expandimos de forma estratégica para novos projetos, como a construção e administração de terminais portuários e aeroportuários, zonas francas e a operação de Duty Free Shops. Hoje, junto ao meu irmão e ao meu primo, representamos a terceira geração à frente da companhia.
Revista 100fronteiras: Em quais áreas você atuou dentro do Grupo?
María Taratuty: Comecei minha carreira na London como Coordenadora-Geral da Fundação, tornando-me diretora alguns anos depois, cargo que ocupo até hoje. A partir da Fundação, trabalhamos com saúde e educação nas cidades onde a London tem atividade comercial.
Com o crescimento que nos levou a ter presença em onze cidades da Argentina e do Uruguai, a comunicação passou a ser um fator-chave dentro do Grupo. Depois do percurso na Fundação, me convidaram também para dirigir a área de Comunicação, com o objetivo de fortalecê-la dentro da companhia. Comecei a liderar um setor ainda em formação, e gosto de pensar que deixei minha marca nesse processo. Com o tempo, a área cresceu e se transformou no que hoje é a Diretoria de Sustentabilidade e Comunicação Estratégica.
No fim das contas, meu percurso se baseou em identificar as necessidades do Grupo ao longo dos anos, aprender com os erros, me capacitar e tentar ser a melhor líder possível.
Revista 100fronteiras: No seu trabalho na Fundação, em quais aspectos você sente que cresceu?
María Taratuty: Sempre digo que trabalhar na Fundação me tornou uma pessoa melhor. Aprendi que a solidariedade é uma troca entre iguais, na qual todas as partes agregam valor, ainda que não seja material. Todos temos algo a oferecer ao outro. É errado fazer nossos filhos acreditarem que têm tudo apenas por terem recursos econômicos. Tento transmitir esse valor aos meus filhos, Bautista e Roberta, de dez e nove anos. Desde pequenos, eles caminharam pelos estabelecimentos de ensino que doamos pela Fundação e compartilharam almoços, brincadeiras e músicas com centenas de crianças. Nunca precisei explicar para onde estávamos indo ou dar contexto. As novas gerações já vêm com uma visão muito mais livre de preconceitos.
Revista 100fronteiras: Como você concilia o papel de mãe com a carreira profissional?
María Taratuty: Em alguns momentos foi difícil, parecia que ser mulher e profissional não podia coexistir com ser mãe. E eu, antes de tudo, sou mãe. Sempre tive dificuldade em delegar idas ao futebol com o Bauti ou em deixar de estar com a Tita em momentos especiais para ela. Sempre escolhi estar presente, e isso me deixava desconfortável no espaço de trabalho. Talvez alguns anos atrás eu tivesse mais dificuldade em administrar esses dois papéis. Hoje me sinto mais segura e conto com uma equipe de excelência na London, na qual posso me apoiar, capaz de assumir meu lugar quando necessário. Esse suporte me permite seguir a criação dos meus filhos de forma mais próxima.
Essa segurança faz com que hoje eu também me sinta firme no meu papel de liderança como mulher. Sendo a primeira mulher Taratuty a trabalhar na London, minha missão não é apenas abrir uma porta, mas mantê-la aberta para que cada vez mais mulheres possam passar.
Lembro que uma vez, depois de um fórum de mulheres líderes —daqueles que você sai totalmente empoderada—, fui buscar minha filha no colégio, ela tinha seis anos. Olhei firme nos olhos dela e disse: “Tita, você sabe que no futuro, se quiser, pode ser presidenta, não é?”. E ela, surpresa, me respondeu inocentemente: “Amanhã?”. O fato de uma mulher poder ser presidenta ou CEO já não está em debate. Para Tita, a surpresa era poder ser “amanhã” (risos).
Revista 100fronteiras: Há alguns anos você vem se posicionando fortemente em espaços de liderança feminina. Como foi esse processo?
María Taratuty: Sinto que foi um processo muito orgânico, parte do crescimento que tive na companhia. Um dos principais desafios —e também uma grande conquista— foi dar o primeiro salto da direção da Fundação para outros papéis no coração do negócio. Nos diferentes times de trabalho, sempre me concentrei em construir uma liderança generosa, tecendo redes para potencializar talentos e desenvolvendo habilidades interpessoais, como comunicação assertiva e empatia, que são essenciais para o crescimento de negócios inovadores.
Pouco a pouco, fomos conduzindo uma verdadeira transformação cultural em uma companhia tão tradicional como a London: começamos a falar sobre diversidade e inclusão, licenças estendidas e espaços de lactação. Hoje, nosso Comitê Diretivo é composto por três mulheres, o que é um grande avanço para a empresa. Assim, quase sem perceber, comecei a compartilhar essas experiências em fóruns importantes como o Women Economic Forum e o GLI Forum Latam. Esses são espaços fundamentais para nos dar visibilidade, nos ouvirmos e nos inspirarmos mutuamente.
Revista 100fronteiras: Qual é o seu próximo grande desafio no London Supply Group?
María Taratuty: Meu próximo grande desafio será, sem dúvida, o mais importante da minha carreira: que a área de Sustentabilidade tenha um impacto profundo dentro do Grupo e de suas operações. Trabalhar com sustentabilidade exige uma visão integral do negócio, revisar processos, questionar nossos líderes, fazer perguntas incômodas, intervir na tomada de decisões. Queremos que a London seja uma companhia sustentável em todos os eixos, e esse é o meu desafio e meu compromisso.
Dentro desse novo papel, sigo atuando como diretora da Fundação, mas agora com uma missão muito mais ampla: levar essa visão solidária e sustentável para o resto do negócio, buscando equilíbrio entre o fator econômico e o impacto no ambiente e nas pessoas.
Revista 100fronteiras: Nesse contexto de sustentabilidade, como você percebe o Duty Free para além do comércio? Qual é a alma que desejam transmitir ao público que visita a loja?
María Taratuty: Iguazú é o primeiro destino turístico sustentável da Argentina. Como um dos grandes atores da região, é nossa responsabilidade estar à altura dessa marca. No Duty Free Shop Puerto Iguazú não apenas vendemos produtos, mas buscamos criar um espaço de conexão e uma experiência memorável para cada visitante. Em um mercado tão competitivo, ser sustentável é um diferencial, pois nos convida a colocar o foco na qualidade da interação humana e na atmosfera que criamos.
E, se falamos de interação humana, não posso deixar de destacar o papel de todas as pessoas que trabalham no nosso Duty, que oferecem um serviço excepcional e mantêm o equilíbrio perfeito entre calor humano, bom atendimento, empatia e profissionalismo.
Revista 100fronteiras: Ultimamente você tem tido maior presença nas redes sociais. Como equilibra seu perfil profissional com a vida pessoal?
María Taratuty: Nesses espaços, busco tr
ansmitir o que sou em essência. Uma mãe empresária, amante dos animais, sensível e atenta ao entorno. Para que tenham uma ideia, meus stories no Instagram vão de uma campanha pediátrica solidária à preparação de uma receita com minha filha; de um evento com autoridades nacionais de Turismo a fotos de cachorros que encontro na rua (risos). Essa sou eu, com minhas virtudes, fraquezas e todas as minhas facetas. Hoje, provavelmente, com meus 42 anos, me permito abraçar essas facetas e me mostrar como sou, sem preconceitos ou inibições.
Revista 100fronteiras: Para finalizar, que mensagem você deixaria para a próxima geração de mulheres empresárias?
María Taratuty: Que continuem o caminho que já estão trilhando, aproveitando de nós tanto os aspectos positivos quanto os aprendizados para não repetir os mesmos erros. Desejo que possamos deixar um terreno próspero para que avancem com firmeza no mundo corporativo, com coragem, segurança e confiança.


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