Aulo Gelio, em seu livro 12 de Noites Áticas, relata um caso interessante que passo a narrar. Diz ele que o procônsul Gneu Dolabela, que nos tempos romanos exercia igualmente o cargo de juiz, teve certa feita em sua presença uma senhora chamada de Esmirna, que lhe foi apresentada como assassina por veneno de seu marido e um dos seus filhos.
Inquirida sobre os motivos que a levaram ao assassinato, ela simplesmente informou que o fizera para vingar a morte de seu filho de outro casamento que os dois provocaram, não havendo controvérsia sobre esse fato.
O procônsul recorreu, então, a seu conselho deliberativo, que deveria ser uma instância superior, que igualmente, não teve condições de dar uma sentença ao caso tão ambíguo, pois consideravam que o envenenamento fora justificado como um ato impune da mulher, que lhe concedia atenuantes.
Não tendo condições de sentenciar, novamente, Dolabela, meditando sobre o que fazer, resolveu recorrer ao grau superior, tipo Tribunal, assim chamado de areopagitas, como juízes de maior peso e experiência superior, tal com os desembargadores de hoje, teriam melhores condições de analisar a demanda. Areópago era um tipo Supremo Tribunal, sediado em Atenas, formado por sábios ou magistrados e conhecido por conceder sentença com senso de justiça e integridade nos julgamentos.
E então, esse colegiado, considerando todos os itens da ação, resolve tergiversar sobre o assunto, marcando uma audiência para ouvir a mulher acusada, no centésimo ano, ou seja daqui a cem anos. Dessa forma, não julgando ou não dando sentença final, eles encaminharam uma solução lógica e definitiva.
Assim, nem a mulher foi absolvida do crime, o que pelas leis da época não seria lícito, nem se condenou ou puniu a mulher que matou, considerando que era digna de perdão pelo tal fato consumado. Ou pelo que se chama de legítima defesa.
Esse relato está escrito também no livro Fatos e Ditos Memoráveis, de Valério Máximo, e vale como um exemplo de julgamento salomônico, isto é, decisão ambígua mas sem a sentença final, e que agradou a todos se fazendo a justiça.
Isso seria possível nos dias de hoje, um julgamento similar sem sentenciamento? Difere um pouco de nossa justiça que mantém por dezenas de anos uma simples ação de cobrança, quanto mais por um assassinato.