Quando se pensa em saudade, pessoas queridas que já se foram logo vêm à mente. Mas não são só seres humanos que deixam marcas na história, bichinhos de estimação, músicas, um momento, um lugar e até mesmo uma mesa de bar podem ficar na memória, para sempre.
Foz do Iguaçu é uma cidade cheia de lembranças, pessoas do mundo todo guardam memórias de um momento, em uma das atrações locais. Pena que nem todos os lugares que marcaram época estão de pé para continuar o legado, um bom exemplo disso, é a lendária lanchonete “Xis-Kão”, fechada em 2012.

A História do Xis-Kão
Para contar um pouco da história do Xis-Kão, a 100fronteiras foi atrás de um dos fundadores. Azenir Pacheco, (professor e empresário), natural do Rio Grande do Sul, foi o caçula entre os dois irmãos e um amigo que tiveram a ideia de fundar a lanchonete.
“Foi uma iniciativa entre família e amigos, os irmãos: Aroldo, Alverie, e Pacheco, com o colega, Odenir, resolvemos abrir uma lanchonete em 1979, pois, na época Foz era muito carente”. O nome Xis-Kão veio da influência das lanchonetes de beira de estrada no Rio Grande do Sul, lá havia muitos lugares chamados de “Xis alguma coisa” como: Xis-BR, Xis Gil…, e foi a partir disso que saiu a ideia de ligar a palavra cão que em inglês é dog, associando a hot dog (cachorro-quente) e “xis”, que é uma transliteração da palavra cheese (queijo em inglês).
A localização sempre foi a mesma. O professor diz que foi fácil conseguir autorização para abrir a lanchonete na região central. “Na época, quem comandava Foz era o Coronel Clovis Cunha Viana, pois o prefeito tinha que ser indicado pelo presidente da República, porque aqui era área de segurança nacional, a autoridade não era eleita pelo povo. A autorização foi, então, dada pelo Coronel.”
Eles não realizaram uma pesquisa de mercado, mas escolheram bem o lugar, tinha que ser acessível e com bom estacionamento, a avenida JK, no centro, foi escolhida. Não existia ainda a terceira pista, que hoje dá acesso ao Bertoni, havia só um buraco. Antes do Xis-Kão, as pessoas já se reuniam naquela área para andar de skate e bicicleta, era uma pista neutra, hoje é a travessa Décio Luiz Cardoso, em homenagem ao arquiteto de Foz.
Azenir afirma que eles não tinham experiência com gastronomia, apenas com comércio, de quando trabalhavam com o pai. “Foi um desafio novo em todos os aspectos, para abrir o lugar e criar os lanches. No menu, as opções que mais saíam eram: o Xis-Kão (moda da casa), Xis-Hulk (x-tudo, havia um cardápio personalizado.
Não houve publicidade no primeiro dia, “foi tudo boca a boca, faltou tudo. Foram tantos clientes que não deu para atender a todos os pedidos, tivemos que fechar mais cedo, foi um sucesso total!”.

Inicialmente, havia um chapeiro, copeiro, uma pessoa no caixa e atendentes, eram cinco pessoas no total, trabalhando em um pequeno quiosque de fibra simples. Para a alegria dos sócios, cada dia tinha mais gente, foi crescendo gradualmente e, sempre tinha algo novo, o povo realmente prestigiava tudo.
Têm muitas histórias por trás das mordidas nos hambúrgueres, lá muitos se conheceram e casaram e, depois, levaram os filhos para lanchar. Uma marcante história foi a do publicitário Paulo Jorge, ele era o locutor da rádio 105 na Avenida, em 1997. “Tivemos a ideia de fazer um bilhete e dar para uma jovem na lanchonete, fingindo que tinha sido ele que mandou, a brincadeira deu tão certo que eles se conheceram e depois casaram e, o mais incrível é que nunca tinham se encontrado antes do bilhete”.

O local era frequentado por todas as classes sociais e idades. Antes de irem aos bailes, ou festas, primeiro passavam no Xis-kão e, depois das festas, retornavam para recarregar as energias, “nos finais de semana, só fechávamos às 6h da manhã, pois, sempre tinha cliente”.
O lugar era seguro, iluminado por ser região central, com o passar dos tempos, fizeram ampliações e melhorias. Como ficava no corredor turístico, muita gente de fora passava por lá e dava uma paradinha.
Aos domingos, na época do Cine Salvatti, o pessoal, antes de ir para o cinema, deixava os carros estacionados perto da lanchonete e, depois do filme, retornavam para lanchar, Pacheco, diz que era algo sagrado, uma forte característica do domingo.
O professor diz que a qualidade foi o grande diferencial, não usavam carnes industrializadas, o X-Frango e o X-Mignon eram de carne pura, característica da lanchonete, fazia grande sucesso.
A popularidade da lanchonete foi crescendo, eles abriam às nove da manhã para prepararem tudo para a noite e, nesses momentos, a clientela já chegava, por isso,
passou a ficar aberta durante todo o dia.
“As pessoas queriam algo rápido e barato para comer no intervalo do trabalho, o Xis-Kão sempre foi uma boa opção”. Em Copas do Mundo, havia TV disponível para os clientes assistirem aos jogos, o que se tornou uma tradição.
“Tinha garçom que atendia no outro lado da Avenida JK, pois, com a falta de lugar, as pessoas eram servidas nos carros em alguns momentos de cheia”. O professor diz,
ainda, que as pessoas iam até lá com todas as finalidades: lanchar, conhecer gente nova, namorar, falar sobre carro, mostrar o carro ou moto e, até fazer negócios, tinha um círculo econômico nesses aspectos.
Até 2001, aos domingos, a rádio era ao vivo e transmitida direto do Xis-Kão, faziam brincadeiras, mandavam recados, tinham festas juninas, moça na banheira, touro
mecânico e “bom de copo”. O esforço dos empresários era sempre recompensado com as novidades.
As filiais
Com o sucesso da marca, eles resolveram expandir os negócios, foi quando surgiram algumas parcerias. A primeira “encaixou como uma luva”, a do Country Clube, lá, foi possível fazer grandes eventos como: aniversários, casamentos e carnavais, eles serviam a comida e organizavam tudo.
Outra, no Floresta Clube, onde se expandiu ainda mais na promoção de festas e eventos com almoços, jantares italianos e carnavais. Depois, os desafios aumentaram para os jovens empresários, abriram uma filial em Medianeira, em sociedade com mais um amigo, não imaginavam que seria um sucesso, mas deu muito certo.
Havia um programa de rádio exclusivo, que fazia um link aos domingos com o Xis-Kão, em Foz, o nome do programa era “Domingo Mix”, realizado pela 97 FM, “o público vibrava com as brincadeiras ao vivo, era um sucesso, isso foi em 1997, época do auge das rádios”.
Com a chegada do Shopping Vendôme, no Paraguai, os empresários receberam uma boa proposta para abrir uma lanchonete lá e, até no país vizinho, o Xis-Kão fazia sucesso. “Tornamos-nos grandes empresários da gastronomia local, a empresa contava com 21 funcionários, tínhamos uma organização exemplar, todo estoque era organizado e computadorizado por conferência, cada fatia de queijo era contada”. Pacheco diz que hoje tem todos os dados e sabe quanto vendeu em determinada época.
Mas nada era fácil, o esforço era grande, tinha que renovar o estoque diariamente para servir tudo fresquinho.
O fechamento
Foz do Iguaçu foi crescendo e novas opções de lazer apareceram, os clubes sentiram isso na pele. Hoje, com o crescimento do mercado de piscinas, muitos lares têm uma com edícula, a pessoa não precisa deslocar-se para tomar banho de piscina e fazer um churrasco.
Os clubes foram deixados um pouco de lado, as festas também sumiram, pois com a chegada de prédios e condomínios, as pessoas usam os salões de festas desses lugares, é mais barato e cômodo e, a nova geração não é de bailes e, sim de outro tipo de festa. “Foi um conjunto de fatores que nos fez fechar as parcerias com os clubes”.
No Paraguai, eles estavam satisfeitos com o movimento, mas como o aluguel foi subindo muito e, era em dólar, decidiram avaliar todo o transtorno que passavam, em levar mercadoria para o país vizinho, aduana, policiais, e viram que a dor de cabeça era grande, foi aí que decidiram vender.
Em Medianeira, não tiveram do que reclamar, compraram a parte do sócio e estavam bem. O que sempre preocupava a todos era a viagem, a estrada era precária e perigosa, não era dupla e sem buracos, como hoje, “avaliamos também os custos e benefícios e, vimos que não dava pra se arriscar tanto na estrada e, também, decidimos fechar”.
Em 1989, Azenir começou a trabalhar sozinho na lanchonete, os irmãos partiram para outros negócios, em fevereiro de 2012, ele fechou o Xis-Kão em Foz do Iguaçu, era o último lugar que mantinha a tradição de mais de 30 anos de história.
Mesmo com o crescimento da cidade e das várias opções de lazer, a lanchonete estava bem e, havia uma boa clientela. Pacheco, diz que não foi a falta de clientes que o fez fechar o negócio, que era rentável e, sim, a falta de autorização para permanecer no local.
“A área era da prefeitura, o prefeito da gestão, que terminou em 2012 não quis autorizar o alvará. Fui perseguido, queriam me tirar dali sem motivos e, fizeram de tudo, os fiscais viviam na lanchonete, mas não para lanchar e, sim, tentar fechar as portas”. Foram quatro anos de luta com a prefeitura e, tudo era muito obscuro para Pacheco, gastou muito e não recebeu a autorização, cansou de lutar e decidiu parar, o curioso é que o lugar, hoje, não está sendo usado, não havia nenhum projeto para construir algo no local.
Como fechar uma empresa que pagava todos os impostos, tinha funcionários e, com 33 anos de tradição em Foz?”. Durante o tempo que esperou pela documentação, ficou na “corda bamba”, o empresário evitou investimentos e inovações no Xis-Kão, pois poderia sair a qualquer momento.
Ele queria expandir os negócios, desejava fazer benfeitorias, colocar ar-condicionado, reformar tudo, oferecer o que podia.
Pacheco diz que já ofereceram propostas para abrir novamente o Xis-Kão em outros lugares, até o exército disponibilizou um lugar próximo do antigo local, “amigos me procuram para abrir, mas eu analiso e vejo que ser empresário gastronômico é uma correria sem fim, hoje tenho uma vida mais tranquila”.
Prefere alugar os equipamentos e lecionar, coisa que adora fazer. Azenir diz que nunca parou de estudar e, mesmo com a lanchonete, estudava e dava aulas desde 1999, fez até mestrado.
O nome Xis-Kão está patenteado e seguro, apenas ele pode usar esse nome, isso dá certa esperança aos clientes. Recentemente, fizeram uma festa para relembrarem a lanchonete, muitos clientes da época reuniram-se para ver fotos e celebrar os tempos de lanches e encontros.
“Por mais que eu me recuse a reabrir a lanchonete, adoro ser empreendedor e, não se sabe o dia de amanhã, quero dizer, que o Xis-Kão ainda pode voltar, quem sabe”
Azenir Pacheco
*Publicado originalmente na revista 100fronteiras edição de fevereiro de 2014.
Mto top a reportagem sobre o Xys Kao, minha juventude passei um bom tempo ali, por estudar no monsenhor Guilherme que era perto e por ir todos os domingos com a glr, qdo chovia não íamos e parecia não ser completo o final semana
Olá sou Marcelo tenho 39 anos acabo de ler uma linda história sobre a lanchonete xis kao gostaria de saber se vcs tem alguma notícia da piscina do bosque, não desvalorizando os clubes que fizerem história em foz do Iguaçu
Que saudades do Xis-Kão!!! 🥰 O lanche deles era delicioso, bom demais!! Fora, que podíamos encontrar os amigos por lá. 😍😋
Foi no Xis-Kão q eu e meu marido começamos a paquerar, onde tudo começou. 🥰❤ Hoje, estamos com quase 37 anos de casados, mais os 3 anos e meio de namoro. Tivemos 3 filhos, 1 deles (in memoriam), infelizmente 😔😭 e 2 netos amados!!
Uma pena, q fechou o Kis-Kão!!! Eles eram The Best, muito TOP!!
Mas quem sabe, como disse o Azenir, o Xis-Kão ainda pode voltar. 👏👏👏
Vou torcer muito, pra que isso aconteça.
Deus os abençoe e que tudo dê certo novamente. 🙏🙌🥰
Abraços a família Pacheco
Parabéns pela reportagem. Seria legal relembrarem outros locais .