Quem nunca fez um pedido e jogou uma moedinha que atire a primeira pedra. Nós somos brasileiros, qualquer ajuda divina é muito bem vinda, né? Infelizmente, essa atitude acaba gerando danos à natureza e poluindo a água que bebemos.

Para início de conversa, por que nós fazemos isso?

Convenhamos, você sabe que não é jogar a moeda nas Cataratas que vai fazer você ganhar na loteria ou curar uma doença. Ainda assim, tentamos, porque existe uma misticidade em pedir ajuda para natureza e de deuses.

Sim, eu falei deuses, porque esse costume começa justamente na Grécia antiga. Naquela época, eram cultuados os deuses mitológicos que aprendemos nas aulas de história – e nos filmes de super-heróis. Os gregos acreditavam que cada poço era protegido por um espírito ou divindade e que jogar moedas para eles garantiria água abundante por todo o ano.

“Os poços também estavam associados à sorte e fertilidade pois é a água que faz a vida crescer no solo”, diz Renato Sabbatini, presidente da Sociedade Brasileira de Céticos e Racionalistas e professor de medicina da Unicamp.

O costume se espalhou e continua forte até hoje. A fonte mais procurada do mundo é a Fontana di Trevi, que se tornou um verdadeiro poço de dinheiro pela quantidade que jogam lá anualmente.

No Brasil, não temos uma grande cultura de fontes em praças. É válido citar que o espelho d’água do Palácio da Alvorada, em Brasília, é o alvo mais comum das moedas. Por outro lado, temos muitas cachoeiras — como as Cataratas do Iguaçu — que acabam sendo vítimas de milhares de moedas por ano.

Mas por que isso é tão ruim?

Segundo André Machado Franzini, gerente de sustentabilidade do Parque Nacional do Iguaçu, muitos visitantes lançam as moedas para fazer pedidos em busca da realização de um desejo, mas acabam ocasionando apenas problemas ambientais, como contaminação do lençol freático e da água, além de de ser prejudicial à saúde dos animais que habitam o ambiente.

“Essas moedas são formadas de metais, níquel e cobre, e em contato com água acabam oxidando. Isso pode liberar toxinas que são prejudiciais. No bolso elas são dinheiro, mas, no meio ambiente, são resíduos”, afirma André.

As moedas ainda são prejudiciais para os animais que habitam o local, alguns até em risco de extinção. “Os peixes podem se despertar pelo brilho e, um dos riscos é de algum animal consumir [as moedas] confundindo com uma presa”, diz o gerente. Além de moedas, nas buscas também são encontrados objetos como celulares, crachás, alianças, colares e outros que, de alguma forma, são deixados nas águas do parque por visitantes.

Além dos animais, nós também somos contaminados pelas moedas jogadas

Liv Ascer, de 37 anos, é doutoranda em fisiologia pelo Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo, e explica que o grande problema de jogar moedas em ambientes aquáticos são os materiais pesados dos quais elas são fabricadas, além da grande quantidade despejada nas águas. “Os metais existem na natureza, mas em concentrações muito baixas.”, diz Liv.

A doutoranda explica que as moedas, quando ficam muito tempo na água, passam por um processo que chamamos de corrosão. Elas meio que “derretem” e soltam os metais na água. Assim, os peixes e outros animais que vivem ali podem acabar engolindo esses metais. E aí, adivinha? Os metais vão se acumulando dentro deles, porque eles não conseguem se livrar dessas substâncias.

Como os organismos não conseguem se livrar desses metais pesados, eles vão se acumulando, e quanto mais velhos são, vivendo em um ambiente contaminado, mais ele vai ter contaminação por metal pesado. Além de trazer uma série de danos fisiológicos para esse organismo, ainda pode ter um processo que chama de biomagnificação

Ou seja, quando um animal come outro que tem esses metais acumulados, ele também fica com esses metais dentro dele. E se um bicho maior comer este, também fica contaminado. Isso é o que os biólogos chamam biomagnificação. No final das contas, quem está no topo da cadeia alimentar, somos nós, humanos, e acabamos sendo também contaminados.

Por mais que seja um costume antigo, que passa de geração para geração, não se deve jogar moedas em ambientes aquáticos. A grande acumulação pode ter efeitos irreversíveis ao meio ambiente e aos animais do entorno que vive, inclusive aos humanos. “As moedas são apenas a ponta para se discutir o impacto das atividades humanas, como o garimpo, descarte de metais vindo de indústrias, muito além desses 158 quilos de moedas”, afirma Liv, fazendo referência à quantidade de moedas recolhidas nas Cataratas em junho de 2023.