Matéria publicada originalmente na edição 44 da Revista 100fronteiras, maio de 2009.

Estima-se que a comunidade árabe de Foz do Iguaçu, predominantemente libanesa, esteja na casa das 12 mil pessoas.

Mohamad Mahmoud Ismail do Centro Cultural Árabe Brasileiro, diz que há noticias de que desde os anos 30, comerciantes libaneses, especialmente os mascates, já “beliscavam” a praça de Foz do Iguaçu e aventuravam-se nas “obrages” da região.

“Mas a partir dos anos 50, começaram a estabelecer-se na região”, conta Ismail que junto com Menzer Osman, à frente da Associação Cultural Árabe-Brasileiro, começou a fazer um levantamento histórico e cultural da comunidade árabe de Foz do Iguaçu.

Na sala que funciona como a sede do Centro Cultural, as paredes estão cobertas de fotos e material de grande valor histórico e cultural cuja importância ultrapassa a fronteira da colônia.

“Já pertence a toda a comunidade iguaçuense e das Três Fronteiras”, explica Menzer Osman, lamentando que este ano não deu para expor na Fernatec – Feira local que celebra a diversidade cultural de Foz do Iguaçu e da Fronteira.

Entre as curiosidades estão o registro de nascimento da primeira criança que nasceu na “Colônia”. Foi uma menina: Florida Hassan El Nirssr no dia 27 de setembro de 1957. O primeiro casal a se casar na colônia árabe de Foz foi Ali Said Rahal e Lida Canan. Há ainda fotos, muitas fotos familiares e documentos como passaportes expedidos no Líbano.

Uma das familias mais antigas da Colônia árabe em Foz do Iguaçu é a família Barakat.

“Meu avó, Mohamad Hussein Barakat imigrou para o Brasil em 1892” diz Mohamad Ibrahim Barakat, ex-vereador, ex-secretário da Indústria e Comércio na gestão do prefeito Harry Daijó. “Na época, o Líbano estava sob o domínio turco, sob o Império Otomano e os libaneses que saiam do Líbano viajavam com passaporte do Império Otomano ou turco. Por isso até hoje, as pessoas chamam árabes em geral de turcos”, explicou Barakat.

O primeiro Barakat a vir para Foz do Iguaçu foi Ibrahim Mohamad Barakat. Ele subiu a abordo de um navio no Líbano no dia 20 de abril de 1950. Um mês depois desembarcou no Porto de Santos em São Paulo, Ibrahim subiu a Serra do Mar e se instalou precariamente em São Paulo.

“Ficou mascateando com amigos no bairro de Jabaquara durante os primeiros meses”, contou.

Em 1951 Ibrahim Barakat chegou a Foz do Iguaçu e se hospedou no Hotel Lamarque (que mais tarde pegou fogo, diz Mohamad Barakat, nosso entrevistado).

“Meu pai contava que na época não havia confecções. O que havia eram cortes de tecido. Em duas ou três semanas ele vendeu tudo e assim ele continuou viajando entre São Paulo e Foz do Iguaçu. Em 1951, chegou meu irmão Adnan Barakat, falecido há quatro anos. Meu pai nasceu em uma cidade libanesa chamada Balul. Minha mãe veio de Lala. O núcleo da Colônia de Foz do Iguaçu é Balul e Lala, cidades localizadas no Vale do Bekaa“.

Segundo Barakat, “esse é o núcleo da Colônia de Foz pelo qual chegaram sobrenomes como Osman, Omairi. Rahal, Sleiman entre outros. Todos de alguma maneira parentes. sobrinhos de pai ou de mãe” disse Barakat. Depois a imigração se estendeu. Barakat cita um levantamento realizado por um professor do Centro Educacional Libanés del Paraguay em Ciudad del Este, que conclui que a Colônia Árabe nas Três Fronteiras hoje representa 180 cidades libanesas.

A partir dos anos 60, a Colônia Árabe de Foz do deixou de ser unicamente libanesa. Yusef Nassar nasceu em Jerusalém em 1939. “Na época a Palestina estava sob domínio inglês e continuou assim até 1948 quando os ingleses se foram e o Estado de Israel foi criado”, esclarece Yusef, comerciante que chegou em Foz em 1960.

“Éramos oito irmãos. Quatro homens e quatro mulheres. Primeiro viemos dois irmãos e depois mais dois. Depois disso veio o restante da família”, conta Yusef, pai de três filhas que nasceram aqui: Samyra, Soraya e Sumaya. “Samyra é jornalista em Foz. Soraya e casada e mora aqui também. Sumaya está em Porto Alegre”, diz com satisfação.

Yussef Nassar desembarcou em Santos em 1957 e foi para o litoral paulista. “Primeiro fomos para Praia Grande onde só havia uma casa”, lembra. Depois, foram para São Paulo onde começou a “mascatear” no Bixiga.

Em 1960, chega a Foz do Iguaçu. “Naquela época era mais fácil se estabelecer. A Avenida Brasil era como a Vila Portes, só tinha comércio. Nos compramos uma casa de madeira que era um hotel e era do pai do Roberto Apelbaum. Depois compramos a casa onde hoje é a Loja Colombo. Mais tarde eu comprei aqui, que era do Hotel Diplomata que estava ampliando” – diz falando sobre o local onde hoje ele bate ponto todos os dias no Salão Avenida, na Avenida Brasil.

“Vou lhe dar uma foto da Avenida Brasil que recortei e mostra como era a Avenida em 1960. Mão dupla. Só dá pra reconhecer o prédio dos Correios”, lembra Nassar que entre coisas esteve na inauguração da Ponte da Amizade e viu o presidente Castelo Branco na ponte que ainda era de madeira.

Na mesma época em que Nassar chegava em Santos, Mohamad Osman, mais tarde se transformaria sogro de Kamal Osman do Kamalito chegou a Foz do Iguaçu. Ele veio com Ahmad, Mustafá, Jamal e Kessem. Mohamad Osman veio de Assai, Norte do Paraná, importante pólo cafeeiro e centro da imigração japonesa.

Não deu outra. Aconteceu um dos primeiros casamentos inter-raciais da colônia. “Foi o começo da miscigenação”, diz Kamal Osman que é primo de Mohamad Osman. “Ele é meu primo e sogro”, diz sorrindo, “Hoje, somos em torno de 150 pessoas só da família Osman entre filhos, netos e bisnetos”.

Breve histórico da Colônia Árabe de Foz do Iguaçu, levantamento da Associação Cultural Árabe Brasileira

  • 1892: passa pela fronteira primeiro árabe libanês que se tem noticia a caminho da Argentina

  • 1930: mascates e comerciantes começam a visitar Foz do Iguaçu

  • 1950: instalam-se, com suas famílias, primeiros imigrantes árabes

  • 1957: nasce em Foz o primeiro filho de árabe

  • 1958: fundada a Associação Cultual Sírio Brasileira de Foz do Iguaçu

  • 1962: fundado o Clube União Árabe de Foz do Iguaçu

  • 1977: lançada a 1ª Fartal. Participação da comunidade árabe é marcante

  • 1980: fundada a Sociedade Árabe Palestina Brasileira

  • 1981: funda-se a Sociedade Beneficente Islâmica de Foz do Iguaçu

  • 1981: funda-se o Centro Cultural Beneficente Islâmico de Foz do Iguaçu

  • 1981: lançada Pedra Inicial da Mesquita Omar El Khatab

  • 1982: começa a funcionar a Escola Árabe Brasileira usando instalações do Colégio Estadual Monsenhor Guilherme.

  • 1986: lança-se a 1º FERNATEC – Feira das Nações, Artesanato, Comercio e Turismo de Foz do Iguaçu

  • 1994: fundado o Lar Druzo Brasileiro de Foz do Iguaçu

  • 1996: inaugura-se a Sede da Escola Árabe Brasileira

  • 1998: fundada a Associação Beneficente Árabe Brasil

  • 1999: fundada a Igreja Evangélica Árabe Brasileira

  • 2001: inaugurada a Escola Libanesa Brasileira, primeira no Brasil com a língua árabe como matéria curricular