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No Brasil, o mês de novembro se transforma em um período de intensa reflexão sobre a história e a cultura afro-brasileira, culminando no dia 20, Dia da Consciência Negra, em homenagem a Zumbi dos Palmares.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísca (IBGE), cerca de 28,5% dos habitantes do Paraná se identificam como negros ou pardos. Em Foz do Iguaçu, este percentual é ainda mais expressivo, alcançando 37% da população. Ainda que estes números sejam expressivos, em todo o Paraná, é Guarapuava que destaca-se como a única cidade a decretar feriado nesta data.
A diretora de Direitos Humanos de Foz do Iguaçu, Mazé El Saad, enfatiza a luta contínua pela visibilidade e reconhecimento, sublinhando a importância de políticas públicas como as cotas raciais para o acesso ao ensino superior.
As políticas de inclusão, no entanto, enfrentam desafios, como revela um estudo dos economistas Renato Schwambach Vieira, da Universidade Católica de Brasília, e Mary Arends-Kuenning, da Universidade de Illinois em Urbana-Champaign (EUA). A pesquisa afirma que as cotas que reservam vagas apenas para egressos de escolas públicas, sem incluir um recorte racial, falham em aumentar a inclusão de negros no ensino superior.
O crescimento de 400% na matrícula de alunos negros no ensino superior entre 2010 e 2019, segundo dados do IBGE, evidencia melhoras, ainda que desproporcionais à representatividade populacional negra no Brasil. O cenário profissional também reflete desigualdades raciais, com apenas 20% dos cargos de liderança ocupados por negros, segundo o Caged.
Em 2019, a cidade viu a criação do Conselho da Promoção de Igualdade Racial (COMPIR) como uma resposta a essas disparidades. Este avanço segue os passos da primeira Conferência Municipal da Promoção da Igualdade Racial, realizada em 2017, e aponta para um futuro mais inclusivo na cidade.
O COMPIR atualmente está focado em melhorar a realidade das mulheres negras em situações de parto, que revela um cenário preocupante de discriminação. O fenômeno conhecido como violência obstétrica continua a ser um obstáculo significativo para todas e, especialmente mulheres pretas.
Definida pelo Ministério da Saúde como uma série de práticas que desrespeitam a autonomia, o corpo e os processos reprodutivos das mulheres, a violência obstétrica se manifesta em diversas formas, incluindo violência verbal, física e sexual, além da realização de intervenções médicas desnecessárias.
A gravidade da situação é evidenciada por uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que revela que uma em cada três mulheres em hospitais privados e 45% das mulheres no Sistema Único de Saúde (SUS) sofrem maus-tratos durante o parto.
Estes índices alarmantes chamam a atenção para os riscos enfrentados por mulheres negras, que são desproporcionalmente afetadas por estereótipos negativos e tratamento inadequado. Ainda mais alarmante é o fato de que os indicadores de mortalidade materna no Brasil não apresentaram melhoras significativas nos últimos 25 anos.
O Conselho também tem se posicionado firmemente contra o desrespeito e a perseguição de religiões de matriz africana. Mazé destacou a importância cultural e espiritual dessas religiões e a necessidade urgente de reconhecimento e respeito dentro da sociedade.
Apesar de a constituição brasileira garantir a liberdade de crença, na prática, as religiões africanas enfrentam frequentemente violações de seus direitos. O desrespeito não é apenas um problema social, mas também institucional, afetando a comunidade em diversos níveis.
A entrevista com Mazé El Saad reforçou a mensagem de que o respeito deve ser estendido a todas as religiões e etnias e que o progresso em direção a uma sociedade verdadeiramente inclusiva e respeitosa depende da contribuição e do comprometimento de todos os cidadãos.
O respeito às diversas crenças é um direito constitucional, mas ainda encontramos barreiras significativas no cotidiano
Mazé Saad
O Conselho, sob a liderança de figuras comprometidas com a causa, busca intensificar as iniciativas para a educação e conscientização sobre a diversidade religiosa e étnica. A chamada para a ação coletiva é um lembrete de que, embora tenham sido feitos avanços, ainda há um longo caminho a percorrer para erradicar preconceitos e discriminações que persistem na sociedade.